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A estratégia da Light de recorrer à recuperação judicial como forma de garantir em última instância a renovação antecipada da concessão de distribuição do grupo é vista como uma medida necessária por uma parcela do mercado. A solução, no entanto, não vai resolver a situação crônica da empresa com uma das campeãs de perdas por furto de energia elétrica, visto como um problema estrutural por profissionais do setor ouvidos pela Agência CanalEnergia.

O advogado e presidente da Associação Brasileira das Companhias de Energia Elétrica, Alexei Vivan, avalia que o fato de a holding ter entrado com pedido de recuperação judicial pode não aliviar a situação da distribuidora, apesar do processo estender a proteção às controladas. “De qualquer forma, o problema continua. A Light tem um problema estrutural”, explicou Vivan, lembrando que a queda de receita com a pandemia somou-se ao alto nível de perdas comerciais, agravando a situação da distribuidora.

A alternativa, que na visão de alguns agentes já poderia ter sido adotada pela Agência Nacional de Energia Elétrica, é a intervenção na Light Serviços de Eletricidade. O executivo da ABCE discorda de medida, argumentando que, além de não resolver uma situação que é de polícia, a Aneel só vai transferir o problema do administrador atual para a agência.

Já a opção por não renovar a concessão traz o imbróglio para a União, que vai trocar o concessionário sem chegar a uma solução. E, mesmo em uma situação em que se adote um modelo hibrido, com a área problemática virando uma sub concessão do serviço assumida pelo Estado, esta continuará sendo uma solução ruim, porque significa aceitar que o poder público nada pode fazer para enfrentar a atuação de milícias e do tráfico de drogas nas áreas classificadas como de alto risco no Rio de Janeiro.

Para o presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Salles, a Light padece de um problema único, que é a ausência do Estado nessas áreas. Salles aponta um segunda questão que afeta não apenas a Light, mas todas as distribuidoras com contratos vincendos até o fim da década, que é a incerteza sobre como vai se dar a prorrogação do contrato de concessão.

“É um serviço de elevados custos operacionais, e perspectiva de longo prazo é essencial para que você tenha uma estrutura dita eficiente”, ponderou o executivo, destacando que a indefinição é ruim, pois tem impacto no custo do financiamento para as distribuidoras. “A hora em que você se aproxima do término da concessão, os financiadores perguntam: e agora, como fica daqui para a frente? Isso dificulta a renovação de financiamentos ou eles ficam mais caros. Financiam mais caro, e um custo que é pago pelos consumidores. Quanto mais cedo definir, melhor para o consumidor.”

O coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da UFRJ, Nivalde de Castro, não acredita em qualquer tipo de jogo ou má intenção da empresa ao entrar com pedido de recuperação judicial. Ele afirma que a Light está “entre a cruz e a espada”, e que o problema das perdas na área de concessão tem se agravado porque a cidade do Rio vem perdendo espaço cada vez mais para o tráfico e a milícia. “Se não tiver uma renovação com tratamento diferenciado para perdas não técnicas, a Light corre o risco de intervenção.(…) Não sabemos como vai ser. Para ter um cenário visível teria que renovar a concessão. Aí ganha outra dimensão.”

O coordenador do Gesel também considera que a possibilidade de intervenção administrativa na companhia pode não ser uma boa alternativa, uma vez que o problema deixa de ser da Aneel com o acionista e passa a ser do governo com a sociedade. Segundo Castro, hoje 58% da baixa tensão está nas chamadas Asro (Áreas Severas de Restrição Operacional), que são áreas de risco.

Ao longo dos anos, a Aneel tem feito um esforço para aumentar a parte do subsídio ao crime que o consumidor fluminense paga na tarifa de energia. Como a criminalidade cresce mais que a cobertura tarifária, fica sempre um déficit para a concessionária, disse o economista.

Outro dado é a crise econômica que afetou a empresa. A dívida conhecida da Light com alguns credores é de R$ 11 bilhões, considerando o endividamento resultante de financiamentos passados, mas há no mercado quem diga que pode chegar a algo da ordem de R$ 18 bilhões. Na rolagem dessa dívida, o que era financiamento transformou-se em compromissos com debenturistas.

“Os bancos foram saindo aos poucos. Então, a rolagem que a Light fez foi captando recursos por meio de debentures e com juros cada vez mais altos”, destacou o coordenador do Gesel. Por meio de uma medida cautelar anterior ao pedido de recuperação judicial, a empresa conseguiu suspender temporariamente os pagamentos a esses credores.

A sócia da área de Infraestrutura e Projetos do Vieira Rezende Advogados, Virginia Mesquita, destaca que o pedido de recuperação foi feito para a holding, mas solicitando que os efeitos do processo sejam aplicados às concessionarias. Na avaliação da advogada, além desse processo há também a questão de uma eventual intervenção que pode ser feita de forma paralela pela Aneel na distribuidora.

A reestruturação da Light, seja na Justiça, seja com a participação da agência reguladora, pode ser uma oportunidade para tratar da questão das perdas. E há ainda uma outra possibilidade que pode ser usada em empresas em processo de recuperação, que é o instrumento da mediação, pondera Virgínia.

Desafios

O Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo também reforçou que a Light enfrenta desafios significativos. O mais antigo e persistente é o furto de energia, que é endêmico no Rio e tem se intensificado ao longo do tempo, exigindo um esforço conjunto de várias partes interessadas, e não apenas da companhia.

Outro ponto desafiador é a elevação das taxas de juros. No caso Light, que está altamente endividada e tem geração de caixa líquido insuficiente, há dificuldades para rolar ou pagar dívidas no vencimento, e até mesmo para cumprir com os pagamentos dos juros da dívida.

“A complexidade da situação é acentuada pela questão jurídica em torno do pedido de recuperação judicial. É incerto se a holding pode estender o pedido de recuperação judicial à distribuidora, um ponto altamente controverso. Além disso, há uma incerteza significativa em relação à renovação das concessões da empresa”, afirma nota divulgada pela entidade.

O Ibef alerta ainda para mudanças recentes na estrutura acionária da Light, com investidores conhecidos por assumirem posições em companhias em dificuldades adquirindo grandes participações e iniciando conversas com credores. Para a entidade, “as agências de rating parecem ter subestimado os riscos, atribuindo até recentemente notas de crédito elevadas à empresa.”

“Este caso ainda verá muitos desdobramentos, e uma preocupação pertinente é quantos e quais casos semelhantes poderemos ver surgindo no horizonte”, acrescentou o instituto.